Somos, ao que parece, um povo eternamente insatisfeito e determinado em ter algo para reclamar. De preferência algo que cause um bom rebuliço no café, enquanto se ajeita o fio com a cruz de ouro no peito peludo e se coça o testículo esquerdo.
Se tudo correr bem, o rebuliço, inicialmente amigável, desenvolve para uma grande peixeirada com direito a gritos sinceros, perdigotos na cara do adversário e, assim a cereja no topo do bolo, um bom par de murros. Mas daqueles murros bem dados, que deixam a cara no adversário como as estradas nacionais deste país. Sim, porque Tuga que é Tuga, não faz por menos.
A bem da verdade, nós vivemos para isto e, em épocas de competições futebolísticas internacionais, os ânimos aumentam consideravelmente.
Em pleno Mundial de 2018, começamos por reclamar dos convocados. Eu percebo perfeitamente. Tuga que é Tuga tem dentro de si uma capacidade divida para a técnica futebolística que desceu dos pícaros do paraíso e cresce exponencialmente a cada jogo visto. Eu compreendo, e partilho da vossa dor. O José Augusto, filho da Maria Cristina ali do fundo da rua, tem uma chuteiras da Nike que comprou ao Zé da Cueca no mercado de Nossa Senhora da Assunção - originais e tudo! - e nem sequer foi considerado na convocatória. Inadmissível!
Mas pronto, o mal está feito. É sofrer e aguentar. Outra característica muita portuguesa. Qualquer português que se preze diz, com o peito cheio e orgulhoso, que fomos feitos para sofrer. Somos, portanto, o sonho de qualquer povo.
No primeiro jogo, enquanto uns previam a derrota certa, outros já esfregavam as nádegas na cara dos seus amigos espanhóis. Empatámos. Mas pronto, o Ronaldo marcou três e jogámos bem... Tolerável.
No segundo jogo, a vergonha das vergonhas! O Ronaldo marcou apenas um golo! Um golo, puto?! Achas que és o quê?! Um excelente jogador?! Nem pensar, meu menino, tu tens de ser um Deus e carregar às costas onze milhões! Não gostas? Temos peninha, treina mais pernas para aguentares a bomboca. E nem quero saber se esse golo nos deu a vitória e, consecutivamente, três pontos que nos aproximaram mais dos oitavos de final. Nada disso, isso não conta para nada! Jogámos mal e, Tuga que é Tuga não precisa de favores de cabrão nenhum.
Pois bem, eu, que pelos vistos sou uma raça rafeira de portuguesa, tenho cá na minha ideia que o que conta são os pontos. Segundo a minha escassa cultura futebolística, o futebol é um jogo cujas competições se ganham através de acumulação de pontos. E existem duas formas de ganhar os ditos cujos: através de um empate ou através de uma vitória. E, sim, até se podem encher os bolsos a alguém com uma ética dúbia mas, ainda assim, o que conta será o resultado.
Eu admito, mais uma vez, a minha escassa cultura futebolística, mas existe alguma regra que dê pontos por "jogar bem"? Aliás, o que é efetivamente "jogar bem"? Normalmente, num jogo, quem ganha é porque jogou melhor. Mas nunca no futebol. Não, no futebol "jogar bem" implica toda uma série de piruetas, passes malucos e jogo de ancas capaz de cortar a respiração ao espetador. Se é bonito, é sim senhor. Mas não é esse objetivo. O objetivo é simples: chegar ao fim do jogo com um número de golos superior ao do adversário. Não interessa se o Moutinho passou para o Pepe com a ponta da gaita, ou se o Ronaldo bateu três vezes com os calcanhares, abanou o rabo, esticou o mindinho e fez um plié. Seria interessante, é certo. Mas não nos daria uma vitória. E não é esse o objetivo. Querem movimentos bonitos que contam efetivamente para o resultado? Deixem o futebol e vejam patinagem artística ou ginástica acrobática e não critiquem os que andaram a suar que nem chinchilas e a moer as perninhas para realizar o sonho de onze milhões.
Eu, pessoalmente, prefiro fazer parte de um país que "joga mal" e ganha, do que um país que "joga bem" e perde.
Já vi excelentes exibições da seleção portuguesa, muito obrigado, agora quero mesmo é títulos e taças. Esta coisa de ser Campeã Europeia - com maiúsculas é muito mais giro - subiu-me à cabeça e, agora que lhe tomei o gosto, ser Campeã do Mundo parece-me bastante agradável.
Aos nossos jogadores - que certamente são leitores assíduos aqui do blogue - façam-me um favor e continuam a "jogar mal", sim? Eu gosto de ir somando pontos de três em três.